Esclerose lateral amiotrófica é considerada uma doença do sistema motor, e o componente mental foi amplamente considerado parte de uma reação psicológica ao drama que portadores e cuidadores enfrentam. Quando a esclerose lateral amiotrófica demorou 55 anos para levar Stephen Hawking, aparentemente ainda em um bom estado mental, cristalizou-se um pensamento tradicional mesmo entre as pessoas mais próximas aos portadores e a profissionais da saúde, de que o componente motor da doença é tão dramático e grave, que alterações do estado mental não são importantes. Porém, este pensamento precisa mudar.
Em torno de 10% dos pacientes tem esclerose lateral amiotrófica e demência fronto-temporal, e o gene C90RF72 que causa esta variante da doença. Demência fronto-temporal é diferente de demência de Alzheimer, por exemplo, no sentido de que ao invés das pessoas perderem a memória, elas perdem o controle do humor, da iniciativa. É um quadro clínico mais comportamental, mais psiquiátrico.
Em torno de 50% das pessoas com esclerose lateral amiotrófica tem um problema cognitivo e/ou comportamental, e certos distúrbios como função executiva, linguagem e fluência de letras são específicos da esclerose lateral amiotrófica, e pioram conforme a doença avança. Outros sintomas típicos das demências fronto-temporais, como apatia, perda da empatia, distúrbios do apetite, desinibição, perseveração e até psicose são comuns. Em um estudo, pelo menos um deles foi observado pelos cuidadores em 55% dos casos. Porém, quem não sabe pelo que procurar não acha. Portanto, é essencial que se generalize este conhecimento, conforme dizem os autores listados abaixo.
Maior ênfase ao aspecto mental precisa ser oferecida pelos médicos, em especial neurologistas. Em um estudo 90% dos pacientes e cuidadores dizem que não haviam sido informados do envolvimento psicológico e psiquiátrico. 62% dos pacientes e 71% dos cuidadores dizem que preferiam ter sido informados. Basta aos neurologistas oferecer o mesmo tipo de informação que já é oferecida aos portadores de esclerose múltipla e doença de Parkinson, por exemplo.
Dr Paulo Bittencourt
Crockford et al. Neurology 2018; 91:e1370-e1380
Wicks e Albert. Neurology 2018; 91:679-681