Home care em esclerose lateral amiotrófica – ELA – foi um problema recorrente dos pontos de vista moral, ético e operacional nos últimos 20 anos. Neste período o chamado atendimento paliativo, que se preocupa com o conforto das pessoas ao invés de se preocupar em curar uma doença, ganhou muito ênfase moral, ética e operacional. Por um lado se tornaram comuns o uso de sondas gástricas e aparelhos respiratórios chamados de BPAPs e CPAPS, assim como a manutenção de gastrostomias e traqueostomias em ambiente domiciliar. Por outro lado, cristalizou-se o entendimento de que portadores de ELA tem direito de escolher se permanecem vivos e em que condições. Pode parecer ridículo, mas em 2009 a Academia Americana de Neurologia retirou home care na esclerose lateral – cuidado paliativo – na ELA – de sua lista de recomendações comprovadas por evidência científica. Por um lado o humanismo e o bom senso foram jogados pela janela; por outro, realmente não havia evidência, segundo a Academia considerou. Contrário ao entendimento da organização que congrega mais neurologistas no mundo que qualquer outra, desde então, o campo de cuidados paliativo explodiu nos EUA, tanto em pesquisa quanto na prática clínica. O entendimento da organização que deveria atender os portadores de ELA foi deixado de lado pela comunidade que atende estes pacientes. Que, então passaram a ter seu cuidado realizado por equipes multidisciplinares, onde o neurologista passou a ser um executor de diagnóstico, e não de cuidado clínico.
Os domínios clássicos de home care em esclerose lateral amiotrófica – cuidados paliativos – incluem as perspectivas física, emocional, social e espiritual do sofrimento das pessoas com doenças graves. Assim, envolvem medicina, enfermagem, reabilitação, saúde mental, assistência social e espiritual. Um estudo revisado pelos autores do artigo da revista Neurology, da própria Academia Americana de Neurologia, incluiu 5 centros do meio-oeste à costa pacífica dos EUA.
J M Gordon and C J Creutzfeld. Neurology 2020; 75: 765-766
Estes centros incluem especialistas em home care – cuidados neuropaliativos – usualmente um neurologista, mas por vezes um internista. Cuidado paliativo melhora qualidade de vida dos doentes e de suas famílias, mas as melhores maneiras de combinar os diferentes componentes, assim como o timing de sua introdução, não estão esclarecidos. O leitor destas publicações fica incerto sobre quem deve ser o coordenador de uma destas equipes, ou o profissional mais próximo do paciente e da família, se neurologista, especialista em cuidados paliativos ou doenças neuromusculares, enfermeiro. Nota-se que toda a estrutura e funcionamento destas equipes varia muito, talvez devido à disponibilidade.
Foi um erro da Academia desprezar cuidados paliativos em 2009. Cuidado paliativo merece atenção pela natureza da medicina, e não só por medidas de resultado. Medicina é uma profissão moral, e no caso da ELA, esta atitude é maior que a simples prática clínica. Envolve atenção e poder de comunicação aos aspectos físicos, emocionais, espirituais e sociais do sofrimento humano. Doentes e suas famílias merecem um cuidado ético e profissional baseado em mais que somente o conceito utilitário das medidas de resultado. Evidências são necessárias para convencer mais profissionais da saúde a estimular a cobertura deste atendimento por planos de saúde. A questão não é se cuidado paliativo deve ser oferecido, mas sim como deve ser oferecido.
Tradução e adaptação – Dr Paulo Bittencourt