Tratamento de células tronco em esclerose múltipla

Transplante de células tronco autólogas hematopoiéticas pode induzir longas remissões em pacientes com esclerose múltipla dose elevada de terapia imunossupressora. Assim concluíram várias publicações recentes, e reacenderam um antigo interesse. Um deles foi o projeto HALT-MS, de Richard A. Nash e colegas, publicado no JAMA Neurology em 29.12.2015, que utilizou carmustina, etoposídeo, citarabina, melfalan e globulina antitimocítica de coelho, levando os pacientes a uma remissão de 3 anos, com discreta melhora da deficiência neurológica. O estudo foi patrocinado pelo National Institutes of Health, e conduzido pelo Immune Tolerance Network.

Um grupo inglês, baseado em Sheffield, descreveu que mesmo pacientes com esclerose múltipla progressiva e déficits neurológicos bem estabelecidos, como é o caso de Cláudia Rodrigues, se beneficiaram do que eles lá chamaram de “tratamento de cancer”. Um grupo canadense, do Dr Mark Freeman, vem lentamente fazendo transplantes em pacientes autorizados um a um, e publicou seus resultados no Lancet também agora, com o mesmo tipo de resultados maravilhosos, de longas remissões e melhoras neurológicas no longo prazo, mesmo em casos de doença antes categorizada como progressiva.

Na verdade o assunto é antigo. Como Cláudia agora, algumas dezenas de pacientes com esclerose múltipla receberam este tratamento em São Paulo e Ribeirão Preto, alguns poucos em Curitiba, e quase 1000 na Europa, estes últimos com muito sucesso e pouca, quase nenhuma mortalidade, para praticamente todas doenças imunológicas em todas as idades. Em nossa clínica, 105 pacientes receberam uma forma mais leve de tratamento desde 2005 para várias doenças imunológicas. O assunto está bem resumido em palavras para o leigo e para o não especialista no meu ebook Pseudoquimera e autoimunidade, uma história do tratamento das escleroses, à venda na amazon.com.

Acredito que o renovado interesse é pela falência da credibilidade nos tratamentos rotineiros, chamados de “disease-modifying”, distribuídos pelo Ministério da Saúde por solicitação de neurologistas, principalmente universitários, que foram treinados especificamente para esta forma de tratamento.

Durante quase 20 anos existiu um buraco negro onde caíram oncologistas e pacientes com esclerose múltipla. Talvez finalmente possa ser articulado que existe um tratamento como o já realizado por Edson Celulari, Reinaldo Giannechini e Cláudia Rodrigues. É simples olhar o que ocorre com o cabelo, que volta mais escuro, mais grosso e enrolado. Assim volta a parte do sangue que produz a imunidade. Dependendo da intensidade do tratamento que for feito, voltará uma imunidade com menos memória, e vai demorar mais tempo para voltar a provocar a doença imunológica. Nos protocolos como o acima mencionado, a mortalidade é 5%. Os europeus usam um protocolo chamado BEAM quase sem mortes. Um grupo em Chicago usa um minitransplante, sem mortalidade, baseado em ciclofosfamida. Nós usamos um tratamento mais leve, também sem mortes em esclerose múltipla, baseado em ciclofosfamida.

Os melhores resultados em esclerose múltipla ocorrem em doentes jovens e doenças jovens, o que é muito lógico, e segue a biologia e das células tronco. O problema é que ocorre menopausa precoce como única complicação definitiva do tratamento, e esclerose múltipla é comum justamente em moças. Não imediata, porém precoce. O que ocorre, então, é um reset, ree-boot, que é completo num transplante alogênico, e tem vários graus de intensidade nos transplantes e tratamentos de alta dose autólogos. Quanto mais intenso, maior a complicação, aparece mortalidade, e maior a chance de remissões muito longas, que podem parecer curas, e até recuperação de função. É óbvio que este é um assunto muito complexo. Para obter mais esclarecimentos, além do meu livro, recomendo que as pessoas procurem seu médico de confiança.

 

Prof. Dr. Paulo Rogério M. de Bittencourt, PhD, FAAN