O artigo da Carta Capital de 4 de novembro de 2015, sobre os tarja preta, escrito por Ingrid Matuoka, diz que segundo a Anvisa, o consumo brasileiro do princípio ativo do Rivotril, o clonazepam, em 2007 era de 29 mil caixas por ano. Em 2015, este número atingiu os 23 milhões, de acordo com a IMS Health. O crescimento significativo em pouco tempo desperta as suspeitas de uso excessivo e desnecessário por parte de especialistas. Os ansiolíticos à base de clonazepam são as substâncias mais consumidas no Brasil entre os 166 princípios ativos de remédios tarja preta segundo o Boletim do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados da Anvisa, entre 2007 e 2010. Este aumento levanta uma suspeita de crime organizado, na verdade, pois um aumento de 1000 vezes, nem posso calcular quanto por cento isto dá, implica em uma complexa operação envolvendo desde a formação do mercado até a fabricação, com importação de insumos, confecção dos comprimidos, em um processo farmacêutico psiquiátrico, em um país de dimensões continentais. É um case jamais visto em qualquer indústria. Muito mais do que 100% de aumento por ano em 8 anos seguidos.
Talvez o que tenha ocorrido é que o Rivotril tivesse sua clássica utilização de antiepiléptico para síndrome de West e outras epilepsias generalizadas secundárias, como foi desde os anos 1970 e 1980. Na década de 1990 otorrinolaringologistas da Escola Paulista de Medicina ensinaram todo mundo a utilizar o Rivotril para quem tem “labirintite”, que é uma bobagem, uma ansiedade. Muitas especialidades médicas, sem conhecimento psiquiátrico, passaram a utilizar um medicamento que no mundo desenvolvido é de uso mais restrito os derivados de morfina. Na verdade também é aqui, basta olhar a caixinha e as receitas azuis. Porém, na vida não basta olhar, precisa enxergar. A empresa farmacêutica enxergou aí a oportunidade e lançou várias formulações como o Rivotril 0,5mg, em gotas, e ensinou meio mundo a prescrever, inclusive clínicos, ginecologistas, ortopedistas, cardiologistas, que obviamente, não tem treinamento de doença mental, mas entraram no buraco negro dos pacientes que odeiam a ideia de se tratar com neurologistas e psiquiatras, justamente porque negam ter problemas neurológicos e psiquiátricos, acham isso uma coisa horrível. Psicanalistas também, profissionais que não tem treinamento algum, usualmente nem residência médica, passaram a prescrever estas medicação.
O sucesso deve ter sido muito maior do que o esperado, pela enorme aceitação dos médicos e da população. Para os epilépticos foi lançado um “novo” benzo, o clobazam, que não tem nada de novo, é um diazepam com uma capa nova, e tem as exatas indicações que eram anteriormente do clonazepam. Esta deve ser a explicação para o crime do século na psicofarmacologia brasileira.
Dr Paulo Bittencourt
http://www.cartacapital.com.br/saude/rivotril-a-droga-da-paz-quimica-3659.html