Discinesia tardia e a penitência de psicóticos e anfetamina

discinesia tardia

Discinesia tardia é uma doença que se tornou endêmica após ser reconhecida nos anos 1960, quando se tornou a Via Crucis de pessoas com psicose, seja doença ou induzida por medicamentos. Trata-se de um distúrbio hiper-motor, quando existem movimentos demais. São movimentos pequenos, descontínuos, de rosto, mãos, pés, tronco, parecem pequenos tiques repetitivos.

https://www.youtube.com/watch?v=FUr8ltXh1Pc

É o contrário de doença de Parkinson, quando as pessoas vão lentamente deixando de executar movimentos e ficando rígidas em certas posturas. Discinesia quer dizer um distúrbio de movimentos inesperados pela anatomia e pela fisiologia. Tardia porque ocorre meses ou anos depois do uso de remédios e drogas que atuam no receptor de dopamina, nos gânglios da base do cérebro. É o mesmo sistema que estraga progressivamente na doença de Parkinson, porém os sinais são ao contrário.

https://www.ninds.nih.gov/Disorders/All-Disorders/Tardive-Dyskinesia-Information-Page#disorders-r1

É resultado de uma corrupção do sistema de saúde que atende pessoas com problemas neurológicos e psiquiátricos. Ao invés de ajudá-los, piora as coisas. A doença só ocorre em quem usa medicamentos ou drogas que bloqueiam ou estimulam o receptor dopaminérgico. Se fosse o caso de colocar a culpa em um segmento do mercado, deveria ser nesta ordem: as empresas farmacêuticas, os políticos da saúde e os médicos. Porém, a culpa é colocada nas vítimas, que não são ajudadas por sua busca constante, obsessiva, compulsiva, por sempre mais, por um up, por humor eufórico, mais capacidade de movimento, mais sexo, mais de tudo. Exigem isso dos médicos. Mudam de médico se o médico não dá o que pedem.

https://en.wikipedia.org/wiki/Tardive_dyskinesia

É uma má doença. Quando começa só piora progressivamente. Algum controle parcial é mais caro ainda do que os pacientes já deveriam ter pagado por um tratamento decente. Desde o fim dos anos 1990 se sabe que existem outros remédios que autistas, insones, psicóticos e parkinsonianos podem tomar. Mas os remédios que o sistema público dá ou que são baratos nas farmácias levam a este problema. Pessoas assim doentes da mente não acreditam que tal maldade vai acontecer com elas, e continuam tomando Ritalina, Sibutramina, Levodopa, Neuleptil, Amplictil, Haldol, seus genéricos e similares. Existem muitos outros medicamentos do mesmo grupo farmacológico que tem esta complicação. O Neuleptil é de uma crueldade ímpar, com uma bula para crianças. Na minha opinião profissional, como neurologista de adultos e crianças com PhD em Farmacologia Clínica, estes remédios não deveriam ser usados em crianças.

Dean, C. E.; Thuras, P. D. (2009). “Mortality and tardive dyskinesia: Long-term study using the US National Death Index”. The British Journal of Psychiatry. 194 (4): 360–4. doi:10.1192/bjp.bp.108.049395. PMID 19336789.

No caso dos parkinsonianos, uma complicação análoga à discinesia tardia é resultado do uso da levodopa, distribuída ao léu pelas associações de Parkinson que proliferaram no Brasil. Toma quem quer, quando e quanto quer, de graça. É uma questão de poucos anos para a doença de Parkinson passar da acinética, com pobreza de movimentos, para a fase das discinesias. É quando eles, já com a doença avançada, desenvolvem movimentos involuntários. O pior é o efeito on-off, quando pacientes alternam períodos do dia de discinesia com outros quando ficam como que desligados da tomada, totalmente parados, não conseguem fazer nada. O início desta história, na virada dos anos 1960 para 1970, está no filme Awakenings (Despertares).

O terceiro grande grupo de pessoas que desenvolvem discinesia tardia são os usuários de drogas e remédios que excitam as pessoas, como a cocaína, os derivados de anfetaminas, ecstasy e similares. Estas substâncias existem no mercado farmacêutico, como a sibutramina, dexanfetamina (Venvanse) e metil-fenidato (Ritalina e Concerta). Os ecstasy e a metanfetamina predominam no mercado ilícito. Muitos medicamentos derivados de anfetamina foram retirados do mercado brasileiro, como o Moderex, Hipofagin e Desobesi. Estes e outros emagrecedores criaram toda uma geração de mulheres loucas com um parkinsonismo estranho, rígidas e estatuescas, porém rápidas, agressivas, com movimentos involuntários. Adolf Hitler tinha este quadro clínico, e sabe-se que usava dexanfetamina, metanfetamina e talvez cocaína.

As pessoas que mais tem chance de desenvolver discinesia tardia grave são os que acumulam os riscos, por exemplo abusando de cocaína ou de Ritalina, e depois precisando tomar Neuleptil para controlar a insônia e a psicose. O dado crítico, de difícil entendimento para o não-especialista, é que drogas e remédios de curta ação, que ocupam e desocupam o receptor dopaminérgico em intervalos de poucas horas, são os piores. Os que menos causam esta complicação e são usados no seu tratamento, são os de longa ação, ficam muitas horas, dias seguidos, no receptor. São mais modernos e mais caros, e quem os sabe usar são médicos de formação profissional mais sofisticada.

Dr Paulo Bittencourt